Lockdown: o esporte e os atletas. Como ficam? Como lidar com um segundo lockdown?

Friedrich Fleischfresser de Amorim , GENPPE - GECE , Paulo Penha de Souza Filho , Thais Weiss Brandão
10/03/2021


 Na última semana de Fevereiro de 2021, o Brasil possuía como média de casos de morte por COVID-19, 1.225 mortes por dia. Com isso,  vários estados brasileiros iniciaram as novas medidas restritivas, decretando novamente o lockdown. Lockdown significa confinamento, restrição, cerceamento, bloqueio total. Quem vive no ambiente esportivo já possui, quase que de forma involuntária, aversão a tais palavras. Esporte é vida, esporte é saúde, ou seja, é algo completamente oposto às 1.225 mortes por dia. Esporte é movimento, esporte é ultrapassar fronteiras, esporte é liberdade. Ou seja, aspectos completamente opostos ao lockdown. Há mais de 1 ano no Brasil, o esporte e o exercício físico parecem não possuir condições mínimas para se desenvolver e sobreviver. 


Mas já passamos por um lockdown em 2020. Será que podemos pensar então que passar por ele uma segunda vez será mais fácil? Afinal de contas, é só utilizarmos todas as estratégias que foram utilizadas na primeira vez. Creio que não seja bem por aí. Cada experiência é única, cada momento é único. Podemos pensar inclusive na ideia heracliana de que uma pessoa não passa por um rio mais de uma vez, pois, na segunda vez, a pessoa não é mais a mesma e o rio já não é mais o mesmo também. Na primeira vez, era algo muito novo, atletas, comissão técnica, profissionais da saúde e diretoria tiveram que se adaptar à nova realidade. Dessa vez, essa adaptação pode ser facilitada por já sabermos, em certa medida, como vai ser e o que precisa ser feito. Como irão funcionar os treinos online, como irão funcionar os treinos físicos, táticos, como será a consulta com o psicólogo, como será a consulta com o nutricionista, com o médico, e assim por diante. Já sabemos também como utilizar as plataformas de chamada de vídeo, o que com certeza já é uma dor de cabeça a menos.


Então será que esse segundo lockdown será tão ruim? No que concerne aos aspectos elencados anteriormente, pode-se dizer que não, pois já sabemos como isso funciona e como vai ser. Por outro lado, acreditamos que muitos de vocês, atletas, já não aguentam mais as incertezas, em ficar pensando se vai ter ou não campeonato, se vai poder viajar ou não, se vai poder treinar ou não na piscina, no ginásio ou no campo na próxima semana. Alguns atletas estavam retornando à sua rotina de treinos e preparando sua periodização para as competições quando foi dada a notícia de que haveria um novo lockdown. Isso tudo é com certeza motivo suficiente para frustrações e baixa motivação. Isso sem contar com aqueles atletas que já foram ou estão infectados pelo vírus, ou que possuem um familiar ou alguém querido que passou ou passa por tal situação. Como manter a motivação, a alta performance e dar 100% todo dia se a sua realidade não comporta todas essas exigências?


O discurso de muitos brasileiros é de que existia uma data marcada para que a pandemia acabasse. Inicialmente, aquelas duas primeiras semanas de lockdown pareciam ser suficientes para acabar com o contágio da Covid-19. Passadas as duas primeiras semanas, foram mais alguns meses imaginando que acabaria no mês seguinte. Isso durou até o final do ano, quando a chegada de um ano novo trazia a perspectiva de situações melhores ao país. Tal fantasia caiu novamente por terra. Começou o novo ano e chegaram as vacinas, o que renovou as esperanças. No entanto, os insumos para produção de vacinas estão acabando e não se vê perspectiva para melhora. Pelo contrário, o número de casos têm aumentado substancialmente depois do Carnaval. Isto desencadeou um novo lockdown. Certo, mas por que estamos contando isso?


Diante de tanta incerteza sobre o que acontecerá na próxima semana ou mês, seja por aumento de casos ou novas medidas restritivas para redução do contágio, fica extremamente difícil planejar metas. Para um atleta que vive de competições, fica muito complicado planejar sua periodização. No começo deste ano, com a chegada das vacinas, algumas equipes voltaram a treinar e alguns órgãos passaram a pensar em datas para competições - a própria Olimpíada está programada para 2021. Porém, com o aumento de casos, vários especialistas insistem que este ano ainda viveremos sob diversas condições restritivas. A pergunta que fazemos diante de tudo isso é: como o atleta lida com esta falta de perspectiva? Sua motivação - motivo da ação - é influenciada por datas e competições que potencialmente realizará, mas, no momento, não há motivo claro para suas ações enquanto atleta. Seu planejamento de metas pode parecer sem sentido, uma vez que não há direção exata a se seguir sem competições e a cada semana são dadas novas restrições e mudanças de datas. Não só isso, o atleta não pode nem usufruir de academias e centros de treinamento que davam suporte à sua prática antes disso tudo começar. O próprio meio socializador já encontrava-se escasso, e aí vem o novo lockdown decretando que os atletas novamente não podem se ver e conviver como sempre fizeram. 


Ainda existe a questão do patrocínio. Se não há competições, muitas empresas deixam de patrocinar seus atletas e eles também deixam de receber potenciais premiações que receberiam com a participação em competições. Nesse meio tempo, as contas não param de surgir e seu ganha-pão já não fornece o que costumava. Fica complicado pensar em que pé o atleta fica diante de tudo isso. Será que segue com seu sonho de ser atleta profissional e arrisca entrar numa dívida gigante? Será que compensa seguir lutando? Será que deixa a profissionalização no esporte para buscar outras formas de renda? Será que compensa abandonar o seu sonho? E principalmente, será que estará feliz e em paz com a decisão que tomar hoje?


Estas são todas perguntas que surgem diariamente para aqueles que trabalham com esporte, mas, principalmente, para nós, psicólogos esportivos. Se formos considerar o principal objetivo da Psicologia Esportiva como melhorar a qualidade da experiência esportiva em integrantes do esporte, nosso trabalho também está dificultado diante de tudo isso. Estamos aqui para oferecer suporte, acolhimento e espaço para que estes desenvolvam suas ferramentas para a prática esportiva. Mas como fazer tudo isso? Como seguir e em que nos apoiar diante de um cenário tão caótico? Como ver a ordem a partir do caos?


Aqui vai então um possível caminho a ser seguido: sinta a angústia, deixe que se expresse, para que dessa forma ela sirva como motor para ajustamentos criativos e novas formas de se enxergar o esporte como um todo. A frustração vem com a morte de uma expectativa, mas são nesses momentos que crescemos. É a partir da destruição que se emerge a oportunidade de novas construções. É a frustração que possibilita a reinvenção e assim a possibilidade de sucesso. Utilize de criatividade e resiliência para lidar com a adversidade. E aí?! Como você vai lidar com a sua adversidade?


Cultive bons hábitos, realize mudanças positivas, estabeleça um objetivo, planeje seu dia e sua semana, marque a sua evolução, deixe-a concreta para você. O planejamento, mesmo que a curto prazo, ajuda no contato com o vazio existencial e, portanto, com a ansiedade. Se possível, pegue um dia para se reorganizar, não faça mais nada, não trabalhe e não treine, reflita sobre sua vida, faça atividades que no seu dia-a-dia você não está acostumado fazer, ajude seu cérebro a pensar de maneiras diferentes.


Viva um dia de cada vez, uma experiência de cada vez. Ao encarar as adversidades, seja o mais sincero e justo possível com você mesmo. Não esqueça do seu valor, dos seus objetivos e da sua missão. Valorize as coisas que você já conquistou em sua vida e não apenas o que você poderia ter conquistado se não fosse o lockdown. 


O que você consegue fazer a partir da sua realidade e de suas possibilidades?



Autores:

Friedrich Fleischfresser de Amorim.

Paulo Penha de Souza Filho,

Thais Weiss Brandão,



Friedrich Fleischfresser de Amorim

Psicólogo

Formado em Psicologia pela Universidade Federal do Paraná (UFPR).

GENPPE - GECE

Grupo de Estudos do Núcleo de Pesquisa em Psicologia do Esporte

GENPPE - GECE

Grupo de Estudos do Núcleo de Pesquisa em Psicologia do Esporte


Objetivo do grupo:


Através de estudos de caso e produção de material, o grupo se propõe a estudar, discutir e aprofundar assuntos referentes à Psicologia do Esporte, de forma autônoma, mas principalmente cooperativa. Buscamos também o aprimoramento e acolhimento de todos os participantes e de suas ideias.


Entre em contato e saiba mais!

Paulo Penha de Souza Filho

Psicólogo

Profº MSc. Psicólogo Paulo Penha de Souza Filho


Paulo Penha de Souza Filho é formado como Psicólogo, Mestre em Distúrbios da Comunicação, Especialista em Fisiologia do Exercício, Especialista em Psicologia do Esporte e Especialista em Psicopedagogia.


Gerente de Saúde Esportiva na Psiccom Saúde Integral (PSICCOM), onde também atende clinicamente. Professor em cursos de pós-graduação e Palestrante. Coordenador do Grupo de Estudos em Ciências do Esporte (GECE). Membro Diretor da Associação de Psicologia do Esporte do Paraná (APEP).


Trabalha em clubes, academias, e no consultório com atletas amadores, profissionais e olímpicos.


Instagram: @psicologodoesporte.paulopenha

Fone: 41- 991084243

e-mail: paulopenha@psiccom.com

Currículo Lattes: Link Lattes: http://lattes.cnpq.br/6354183003893876



Thais Weiss Brandão

Psicóloga

Psicóloga clínica e esportiva, graduada pela PUCPR em 2020. Coordenadora do Grupo de Estudos do Núcleo de Pesquisa em Psicologia do Esporte. Colaboradora da Comissão de Psicologia do Esporte do CRP 08 (Paraná). Possui também apresentações de trabalho de pesquisa em congressos nacionais e internacionais, além de publicações em anais, revistas e capítulos de livro acerca da Psicologia do Esporte. Trabalha com esportes coletivos e individuais, atendendo equipes e atletas amadores e profissionais. Participação em eventos internacionais esportivos, como mesmo integrante da Comissão de Saúde.

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